Companhia - Avião particular de Jean-Pierre Bemba
Aeronave - Boeing 727-100 (C9Q-CMC)
Local - Aeroporto de Faro, Portugal
Desde Abril de 2007 que um avião privado, um Boeing 727-100, está retido no Aeroporto de Faro, à ordem do Tribunal Penal Internacional (TPI), na cidade holandesa de Haia. A aeronave, matrícula 9Q-CMC, é propriedade do antigo vice-presidente Jean-Pierre Bemba, da República Democrática do Congo. Actualmente, Bemba está em julgamento, segundo a acusação, por crimes de guerra e contra a humanidade. Entretanto, em Faro, o avião tornou-se um estorvo e já faz lembrar o caso do velho Boeing 707 do ex-ditador do Zaire, Mobutu Sesse Seko, que esteve 15 anos a enferrujar em Lisboa, até finalmente ter sido desmantelado para sucata em 2006.
A história remota ao dia 11 de Abril de 2007. O ex-vice-presidente da República Democrática do Congo (RDC) Jean-Pierre Bemba deixa Kinshasa com destino a Portugal, após três semanas de combates entre sua guarda pessoal e o Exército congolês – conflito gerado ainda na ressaca da derrota nas eleições em 2006, para Joseph Kabila. Bemba instalou-se então numa vivenda na zona da Quinta do Lago, que já possuía.
O seu avião particular ficou estacionado normalmente em Faro. Contudo, na noite de Sábado, 24 de Maio de 2008, Bemba foi detido em Bruxelas, por ordem do Tribunal Penal Internacional (TPI). É, segundo a acusação, responsável pelas acções de uma milícia armada que terá enviado para a República Centro-Africana (RCA) para apoiar o regime do Presidente Ange-Félix Patassé, entre Outubro de 2002 e Março de 2003. O avião e outros bens foram então arrestados por ordem judicial de Haia.
“Caberá, em última instância, aos tribunais decidirem o destino a dar à aeronave, pelo que é prematuro efectuar qualquer conjectura” sobre o seu futuro, esclarece Rui de Oliveira, porta-voz oficial da ANA Aeroportos. “Até decisão dos tribunais que altere a situação, os custos são da responsabilidade do proprietário”, acrescenta.
Segundo outra fonte próxima da empresa, o preço do estacionamento ronda 1 euro por tonelada por dia. Admitindo que o velho avião pesa cerca de 70 toneladas, à data do fecho desta edição, terá passado 1800 dias na placa, ou seja 126 000 euros gastos só em taxas de parqueamento. Eventualmente, esta despesa acabará por ultrapassar o valor do próprio avião, que entretanto também perde operacionalidade.
“As aeronaves para poderem voar devem estar certificadas, pela posse de um Certificado de Navegabilidade que só é emitido perante a realização comprovada das manutenções internacionalmente exigidas. Como não têm sido realizadas acções de manutenção no B727 é de presumir não detenha, neste momento, tal documento, o que é impeditivo de que possa voar”, acrescenta Rui de Oliveira.
Sobre o Boeing 727-100 congolês encalhado em Faro, Fernando Mesquita considera ter “uma história interessante. Originalmente foi entregue à Lufthansa com a matrícula – D-ABIQ (número de série 18371/145) a 25 de Maio de 1965. Passados três anos, em Março de 1968 foi entregue à Condor, uma subsidiária da companhia alemã, onde esteve até 1982. Em Junho desse ano, foi repintado na Suíça e foi transformado em avião executivo. Depois disto, foi o transporte oficial do Sultão do Brunei que o operou de Outubro de 1983 a Março de 1989. Durante estes anos, teve três matrículas diferentes”.
Consta que o interior era muito luxuoso, embora não existam, até hoje, fotografias no domínio público que possam comprar este mito.
“Em 1992, o avião passou para o Sultão do Padang (o maior estado da Malásia) que o operou até 1995. Nos dez anos seguintes, esteve ao serviço de um milionário cipriota e era visto com frequência na Alemanha. Em 2006 foi para o Texas, para receber uma renovação dos interiores” até ser adquirido pelo proprietário actual.
Aliás, quando o avião chegou pela primeira vez a Faro em Janeiro de 2007, trazia uma matrícula americana. Um episódio que provocou alguma polémica nos meandros da aviação, mas o chefe da divisão de relações com a comunicação social da ANA desdramatiza.
“A aeronave voava com uma licença provisória dos EUA (onde tinha acabado de ser adquirida) e a sua entrada na EU ocorreu em Shannon na Irlanda. O voo de Shannon para Faro foi um voo dentro da comunidade absolutamente normal. Após a sua chegada ao aeroporto de Faro, requereu a alteração da licença provisória dos EUA para uma matrícula definitiva do Congo. Estas situações apesar de não vulgares, não configuram nenhuma irregularidade. Importa, ainda, salientar que esta ocorrência nada tem a ver com a actual situação da aeronave no aeroporto de Faro”, esclarece Rui de Oliveira.
Foi uma empresa da freguesia do Montenegro, ali perto, que fez as letras da matrícula 9Q-CMC que hoje o avião sustenta. Este número que a autoridade aeronáutica do Congo atribuiu ao Boeing de Bemba pertenceu, a um avião de fabrico russo que se despenhou na capital do país...
Segundo apurámos de fontes credíveis, o penúltimo voo que Bemba fez no B727 a partir de Faro, foi com destino a Tripoli, Líbia, ainda antes da queda do regime de Muamar Kadhafi. Outra informação interessante é que Bemba terá saído de Portugal num voo normal da Easyjet quando foi detido na Bélgica, em Maio de 2008 – embora, na altura, o seu avião particular ainda estivesse em condições de voar.
Ainda sobre a futura operacionalidade (ou não) desta aeronave, apurámos que o avião tem perdido muitos fluídos e óleos, sobretudo dos sistemas hidráulicos.
“Nada nos permite afirmar que a aeronave está avariada. Existe, isso sim, a garantia que as manutenções requeridas não foram efectuadas e para que possa voar será necessária a sua realização. De todos os modos, será no final, tudo uma questão económica”, conclui Rui de Oliveira.
Vislumbrando o previsível final dramático para este clássico, perguntamos ao entusiasta Fernando Mesquita se perspectiva a possibilidade do B727 encalhado poder vir a dar origem a um projecto semelhante ao do aeroporto de Zurique - que recuperou um bimotor russo para criar um restaurante/bar? Ou o antigo 747-200 que foi transformado num hotel em Estocolmo?
“Teria que ser um privado a avançar, a comprar o avião a preço simbólico. A seguir, teria um problema grande para resolver. Neste momento, não existe saída para o transportar por terra. O Aeroporto de Faro tem duas portarias, ambas pequenas. Mesmo considerando a hipótese de o retirar pelo sítio do Arábia, seria muito difícil há um desnível muito grande. Portanto, teria que se desmantelar a infra-estrutura e seria uma operação muito cara. Há outra hipótese. Poder-se-ia desmantelar-se o avião. Mas que é quem é que faz isso? Quem é que desmantela asas? Só mecânicos qualificados que cobram uma fortuna. E mesmo assim, seriam necessárias gruas especiais para o remover dali.”
Mesmo um potencial interessado em tirar dali o avião por via terrestre, teria que pedir autorizações especiais à ANSR - Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária para o transportar. De acordo com as especificações deste modelo, só de envergadura mede 40,59 metros. Tem uma altura máxima de 10,36 metros e 157 metros quadrados de asa.
“Quanto a mim, a Lufthansa é que poderia ter interesse, pois é um dos últimos exemplares da sua série que está intacto. Mas em boa verdade, muitos destes aviões foram parar ao deserto, e há clássicos mais clássicos. A Alemanha liga muito às antiguidades. Em Munique têm um Dakota e um Junkers-52. Nós deixamos arder o último Super Constellation da TAP”, considera.
Apesar de terem sido construídos 582, hoje “B727-100 a voar, no mundo todo, não devem ser mais de meia centena, sobretudo a transportar carga. Há alguns também a operar em África. Portanto, as peças não têm valor. Há muitos que foram para os verdadeiros armazéns canibalizadores em Victorville, ou Marana, nos Estados Unidos da América, onde há instalações para aproveitar tudo”, conclui.
A história remota ao dia 11 de Abril de 2007. O ex-vice-presidente da República Democrática do Congo (RDC) Jean-Pierre Bemba deixa Kinshasa com destino a Portugal, após três semanas de combates entre sua guarda pessoal e o Exército congolês – conflito gerado ainda na ressaca da derrota nas eleições em 2006, para Joseph Kabila. Bemba instalou-se então numa vivenda na zona da Quinta do Lago, que já possuía.
O seu avião particular ficou estacionado normalmente em Faro. Contudo, na noite de Sábado, 24 de Maio de 2008, Bemba foi detido em Bruxelas, por ordem do Tribunal Penal Internacional (TPI). É, segundo a acusação, responsável pelas acções de uma milícia armada que terá enviado para a República Centro-Africana (RCA) para apoiar o regime do Presidente Ange-Félix Patassé, entre Outubro de 2002 e Março de 2003. O avião e outros bens foram então arrestados por ordem judicial de Haia.
“Caberá, em última instância, aos tribunais decidirem o destino a dar à aeronave, pelo que é prematuro efectuar qualquer conjectura” sobre o seu futuro, esclarece Rui de Oliveira, porta-voz oficial da ANA Aeroportos. “Até decisão dos tribunais que altere a situação, os custos são da responsabilidade do proprietário”, acrescenta.
Segundo outra fonte próxima da empresa, o preço do estacionamento ronda 1 euro por tonelada por dia. Admitindo que o velho avião pesa cerca de 70 toneladas, à data do fecho desta edição, terá passado 1800 dias na placa, ou seja 126 000 euros gastos só em taxas de parqueamento. Eventualmente, esta despesa acabará por ultrapassar o valor do próprio avião, que entretanto também perde operacionalidade.
“As aeronaves para poderem voar devem estar certificadas, pela posse de um Certificado de Navegabilidade que só é emitido perante a realização comprovada das manutenções internacionalmente exigidas. Como não têm sido realizadas acções de manutenção no B727 é de presumir não detenha, neste momento, tal documento, o que é impeditivo de que possa voar”, acrescenta Rui de Oliveira.
Sobre o Boeing 727-100 congolês encalhado em Faro, Fernando Mesquita considera ter “uma história interessante. Originalmente foi entregue à Lufthansa com a matrícula – D-ABIQ (número de série 18371/145) a 25 de Maio de 1965. Passados três anos, em Março de 1968 foi entregue à Condor, uma subsidiária da companhia alemã, onde esteve até 1982. Em Junho desse ano, foi repintado na Suíça e foi transformado em avião executivo. Depois disto, foi o transporte oficial do Sultão do Brunei que o operou de Outubro de 1983 a Março de 1989. Durante estes anos, teve três matrículas diferentes”.
Consta que o interior era muito luxuoso, embora não existam, até hoje, fotografias no domínio público que possam comprar este mito.
“Em 1992, o avião passou para o Sultão do Padang (o maior estado da Malásia) que o operou até 1995. Nos dez anos seguintes, esteve ao serviço de um milionário cipriota e era visto com frequência na Alemanha. Em 2006 foi para o Texas, para receber uma renovação dos interiores” até ser adquirido pelo proprietário actual.
Aliás, quando o avião chegou pela primeira vez a Faro em Janeiro de 2007, trazia uma matrícula americana. Um episódio que provocou alguma polémica nos meandros da aviação, mas o chefe da divisão de relações com a comunicação social da ANA desdramatiza.
“A aeronave voava com uma licença provisória dos EUA (onde tinha acabado de ser adquirida) e a sua entrada na EU ocorreu em Shannon na Irlanda. O voo de Shannon para Faro foi um voo dentro da comunidade absolutamente normal. Após a sua chegada ao aeroporto de Faro, requereu a alteração da licença provisória dos EUA para uma matrícula definitiva do Congo. Estas situações apesar de não vulgares, não configuram nenhuma irregularidade. Importa, ainda, salientar que esta ocorrência nada tem a ver com a actual situação da aeronave no aeroporto de Faro”, esclarece Rui de Oliveira.
Foi uma empresa da freguesia do Montenegro, ali perto, que fez as letras da matrícula 9Q-CMC que hoje o avião sustenta. Este número que a autoridade aeronáutica do Congo atribuiu ao Boeing de Bemba pertenceu, a um avião de fabrico russo que se despenhou na capital do país...
Segundo apurámos de fontes credíveis, o penúltimo voo que Bemba fez no B727 a partir de Faro, foi com destino a Tripoli, Líbia, ainda antes da queda do regime de Muamar Kadhafi. Outra informação interessante é que Bemba terá saído de Portugal num voo normal da Easyjet quando foi detido na Bélgica, em Maio de 2008 – embora, na altura, o seu avião particular ainda estivesse em condições de voar.
Ainda sobre a futura operacionalidade (ou não) desta aeronave, apurámos que o avião tem perdido muitos fluídos e óleos, sobretudo dos sistemas hidráulicos.
“Nada nos permite afirmar que a aeronave está avariada. Existe, isso sim, a garantia que as manutenções requeridas não foram efectuadas e para que possa voar será necessária a sua realização. De todos os modos, será no final, tudo uma questão económica”, conclui Rui de Oliveira.
Vislumbrando o previsível final dramático para este clássico, perguntamos ao entusiasta Fernando Mesquita se perspectiva a possibilidade do B727 encalhado poder vir a dar origem a um projecto semelhante ao do aeroporto de Zurique - que recuperou um bimotor russo para criar um restaurante/bar? Ou o antigo 747-200 que foi transformado num hotel em Estocolmo?
“Teria que ser um privado a avançar, a comprar o avião a preço simbólico. A seguir, teria um problema grande para resolver. Neste momento, não existe saída para o transportar por terra. O Aeroporto de Faro tem duas portarias, ambas pequenas. Mesmo considerando a hipótese de o retirar pelo sítio do Arábia, seria muito difícil há um desnível muito grande. Portanto, teria que se desmantelar a infra-estrutura e seria uma operação muito cara. Há outra hipótese. Poder-se-ia desmantelar-se o avião. Mas que é quem é que faz isso? Quem é que desmantela asas? Só mecânicos qualificados que cobram uma fortuna. E mesmo assim, seriam necessárias gruas especiais para o remover dali.”
Mesmo um potencial interessado em tirar dali o avião por via terrestre, teria que pedir autorizações especiais à ANSR - Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária para o transportar. De acordo com as especificações deste modelo, só de envergadura mede 40,59 metros. Tem uma altura máxima de 10,36 metros e 157 metros quadrados de asa.
“Quanto a mim, a Lufthansa é que poderia ter interesse, pois é um dos últimos exemplares da sua série que está intacto. Mas em boa verdade, muitos destes aviões foram parar ao deserto, e há clássicos mais clássicos. A Alemanha liga muito às antiguidades. Em Munique têm um Dakota e um Junkers-52. Nós deixamos arder o último Super Constellation da TAP”, considera.
Apesar de terem sido construídos 582, hoje “B727-100 a voar, no mundo todo, não devem ser mais de meia centena, sobretudo a transportar carga. Há alguns também a operar em África. Portanto, as peças não têm valor. Há muitos que foram para os verdadeiros armazéns canibalizadores em Victorville, ou Marana, nos Estados Unidos da América, onde há instalações para aproveitar tudo”, conclui.
adaptado de Artigo Algarve123
Imagens Airliners
Foto Biel Gomila, Airliners
Nunca imaginei que aquele trambolho fosse um B 727. Curioso.
ResponderEliminarUau...talvez por não saber o que é um pois aquele B727 de trambolho não tem nada
EliminarJá deviam ter resolvido isso os tribunais são uma vergonha o avião dá mau aspecto ao aeroporto de Faro
ResponderEliminarEntretanto, o Jean-Pierre Bemba tornou-se Ministro da defesa da República Democrática do Congo desde 2023.
ResponderEliminarPorque é que o Governo de Portugal não põe alguém a tratar do assunto?